Novo presidente do CFM acredita que Bolsonaro ‘se desdobrou’ no enfrentamento à pandemia

Mauro Ribeiro deixou a presidência do Conselho Federal de Medicina no início deste mês, mas a ideologia bolsonarista que tomou o órgão durante seu mandato não deixará o CFM tão cedo. No lugar do cirurgião-geral, tomou posse o ginecologista José Hiran da Silva Gallo, admirador confesso do “capitão Bolsonaro”, como se referiu ao presidente em um artigo que comemorava sua vitória em 2018.

O texto – curiosamente publicado no site do Conselho Regional de Medicina de Rondônia, embora nada tenha a ver com o exercício da profissão – entrega o encantamento de Gallo pelo ex-militar já no título, “A esperança venceu o medo”. Em uma demonstração gritante de elitismo, o atual presidente do CFM avalia que, por ter sido mais votado pelos mais pobres, Haddad teve um desempenho “estritamente ligado à existência de um quadro agudizado pela carência”. Já Bolsonaro, que liderou entre os mais ricos, teria contado com os votos de quem espera “medidas que ataquem problemas como o desemprego, a falta de segurança e a corrupção” em vez de caridade.

“O recado do eleitorado é um só: o medo diante dos poderosos de plantão deu lugar à esperança”, escreveu o médico, acrescentando que neste “novo Brasil”, movido pela ética e pela justiça, todos serão “livres para expressar seu pensamento sem temer ameaças de retaliação”.

Nem a atuação desastrosa de Bolsonaro e seus ministros da Saúde durante a pandemia foi suficiente para tirar as lentes cor-de-rosa com que Gallo enxerga seu capitão. Quando o Brasil já contabilizava mais de 100 mil mortos pelo coronavírus, em agosto de 2020, o ginecologista voltou a escrever sobre Bolsonaro, saindo em sua defesa.

Para ele, eram injustas as tentativas de culpar o presidente pela situação do país, típicas de quem “sai à caça de bruxas e de bodes expiatórios”, ignorando que, em processos assim, “erros e acertos” se sucedem. Até aí, Bolsonaro já havia afirmado que a covid-19 não passava de uma “gripezinha” e soltado outras frases que marcariam seu desprezo pela crise sanitária, como “não sou coveiro” e “e daí, lamento, quer que eu faça o quê?”. Mas nenhum dedo de Gallo se virou para ele. Esses eram apenas “deslizes na comunicação” do governo federal que, na visão do médico, “se desdobrou” para aumentar a oferta de leitos, além de contratar médicos e repassar recursos aos estados.

Os dedos de Gallo tinham outros alvos. Um foi apontado para o Judiciário, a quem acusou de ter criado “obstáculos à tomada de decisões do Executivo no enfrentamento à covid-19″. Outro, para “parcela importante” da imprensa que, para ele, tratou a pandemia como um “espetáculo macabro, insuflando pânico em lugar de esclarecimento”.

Até na hora de defletir culpa o presidente do CFM e o presidente da República estão na mesma página.

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