Entre os assuntos tratados no primeiro encontro, estava a viabilidade financeira e o programa de governo do ex-juiz. A Lei Eleitoral permite que um pr\u00e9-candidato possa apresentar a pretens\u00e3o de se candidatar, dar entrevistas e falar de projetos, mas sem pedir voto. No entanto, n\u00e3o h\u00e1 clareza sobre a contrata\u00e7\u00e3o de uma empresa do pr\u00e9-candidato para que ele apresente suas propostas de governo de forma remunerada.<\/p>\n
Os demais R$ 33 mil do contrato, um ter\u00e7o do valor, s\u00e3o para pagamento, nas mesmas datas e condi\u00e7\u00f5es, \u00e0 empresa Delos Produ\u00e7\u00f5es Culturais Ltda, que \u00e9 um bra\u00e7o do grupo DC Set Participa\u00e7\u00f5es, controlado por Jorge Sirena, marqueteiro de Moro. Dody Sirena, como \u00e9 conhecido, tamb\u00e9m \u00e9 empres\u00e1rio do cantor Roberto Carlos e foi multado em mar\u00e7o do ano passado em R$ 25 mil pelo Banco Central por n\u00e3o ter declarado <\/a>dentro do prazo bens e valores que mantinha no exterior. \u00c0 \u00e9poca, Moro j\u00e1 tinha deixado o governo Bolsonaro e fechado contrato<\/a> com a empresa de Sirena para que o empres\u00e1rio promovesse suas palestras na \u00e1rea corporativa e cuidasse de sua imagem.<\/p>\n A empresa Delos Produ\u00e7\u00f5es Culturais Ltda consta no contrato como \u201cinterveniente anuente\u201d, ou seja, uma terceira pessoa que pode ser afetada ou beneficiada pela negocia\u00e7\u00e3o entre contratante e contratado. O documento considera que a empresa de Dody \u201cest\u00e1 apta a agenciar e administrar os interesses e atividades\u201d da empresa de Moro. Questionei Sirena e Moro sobre a rela\u00e7\u00e3o que ambos possuem e a participa\u00e7\u00e3o de cada parte no evento, mas n\u00e3o obtive resposta.<\/p>\n O contrato \u2013 que n\u00e3o ser\u00e1 publicado para preservar a fonte \u2013 tamb\u00e9m tem cl\u00e1usulas de confidencialidade. Isso talvez explique por que n\u00e3o foram divulgadas fotos e nenhuma das partes do contrato confirmou ou negou o evento. Um dos itens do documento chama a aten\u00e7\u00e3o para o fato do palestrante ser pr\u00e9-candidato. A \u201cCONTRATADA [empresa de Moro] declara-se ciente de que o Palestrante \u00e9 pr\u00e9-candidato a Presidente da Rep\u00fablica e que, consequentemente, as datas dos Encontros dever\u00e3o, necessariamente, observar as restri\u00e7\u00f5es do calend\u00e1rio eleitoral, conforme legisla\u00e7\u00e3o vigente”, diz o documento.<\/p>\n O documento de 10 p\u00e1ginas, com as informa\u00e7\u00f5es sobre local, data, participantes e condi\u00e7\u00f5es do encontro foi entregue ao Intercept por uma fonte an\u00f4nima antes de a reuni\u00e3o acontecer. Todas as partes assinaram esta vers\u00e3o do contrato, exceto o ex-juiz. O acordo foi firmado pelo diretor e representante da Ativa Investimentos, Attilio de Souza Mello Boselli, e do procurador da empresa, Guilherme Uch\u00f4a Coelho, por meio de assinaturas digitais. Constam tamb\u00e9m a assinatura do diretor da Delos, Rodrigo Bertho Mathias, e de duas testemunhas, Talitha Angelo da Silva<\/a>, advogada da Ativa, e Amauri Carvalho, n\u00e3o identificado por seu cargo.<\/p>\n O documento estipula que cabe \u00e0 contratante, Ativa Investimentos, arcar com todos os \u201ccustos que, direta ou indiretamente, for (sic) relacionada \u00e0 realiza\u00e7\u00e3o dos Encontros e da participa\u00e7\u00e3o do Palestrante\u201d, assim como \u201cas licen\u00e7as, impostos e taxas incidentes sobre a realiza\u00e7\u00e3o dos Encontros\u201d.<\/p>\n A empresa de Moro que aparece no contrato \u00e9 a mesma que ele utilizou para prestar servi\u00e7os \u00e0 consultoria Alvarez & Marsal, nos Estados Unidos. O Tribunal de Contas da Uni\u00e3o investiga o eventual conflito de interesse e <\/a>os ganhos do ex-juiz com a empresa, que tem entre os clientes companhias que foram alvo de decis\u00f5es da Lava Jato tomadas por Moro.<\/p>\n Em 28 de janeiro, para explicar os valores que recebeu no seu per\u00edodo junto a Alvarez & Marsal, Moro fez uma live ao lado do deputado federal Kim Kataguiri, do MBL e do DEM de S\u00e3o Paulo. Durante a apresenta\u00e7\u00e3o, Moro disse que embolsou R$ 3,6 milh\u00f5es<\/a> por cerca de um ano de trabalho, entre novembro de 2020 e outubro de 2021.<\/p>\n Durante a transmiss\u00e3o, Moro defendeu que todos os candidatos \u00e0 Presid\u00eancia abrissem suas contas e dessem transpar\u00eancia a seus rendimentos. No entanto, ao contr\u00e1rio do que ele prega, o ex-juiz n\u00e3o quis esclarecer os R$ 77 mil que constam do contrato com a Ativa Investimentos. Procurei pela sua assessoria entre os dias 16 e 18 de fevereiro, e, apesar de terem recebido meus questionamentos, n\u00e3o deram respostas sobre o contrato, a reuni\u00e3o com a Ativa Investimentos e a rela\u00e7\u00e3o com empres\u00e1rio e marqueteiro Dody Sirena.<\/p>\n Empres\u00e1rio de Roberto Carlos, Sirena se tornou respons\u00e1vel por promover as palestras de Moro e cuidar de sua imagem. Mas, apesar do pagamento de R$ 33 mil, ele n\u00e3o estava no encontro no Rio, segundo um dos presentes.<\/p>\n \nFoto: Reprodu\u00e7\u00e3o\/Instagram<\/p><\/div>\n Das duas reuni\u00f5es previstas no contrato, uma estava agendada para as 10h30 de 15 de fevereiro, no luxuoso hotel Janeiro, no bairro do Leblon, no Rio de Janeiro.<\/p>\n No dia 15, a assessoria de Moro me informou que ele n\u00e3o teve agenda naquela data. J\u00e1 a assessoria de imprensa da Ativa Investimentos confirmou apenas que \u201cperiodicamente, faz encontros e palestras com personalidades p\u00fablicas para clientes institucionais da corretora\u201d, mas n\u00e3o confirmou ou negou o encontro com Moro. Na nota, informou tamb\u00e9m que \u201cos eventos s\u00e3o reservados para convidados e com o \u00fanico objetivo de tra\u00e7ar os melhores cen\u00e1rios econ\u00f4micos para seus clientes\u201d.<\/p>\n A recep\u00e7\u00e3o do hotel, por telefone, me informou que n\u00e3o poderia passar tais informa\u00e7\u00f5es. Naquele mesmo dia, a reuni\u00e3o foi noticiada no jornal O Globo<\/a>, sem informa\u00e7\u00f5es sobre a remunera\u00e7\u00e3o a Moro, os participantes, o nome da empresa Ativa Investimentos e a rela\u00e7\u00e3o entre Moro e os empres\u00e1rios. Um dos temas do encontro, segundo a colunista Malu Gaspar, foi a viabilidade financeira da campanha de Moro.<\/p>\n O ex-ministro do ex-presidente Michel Temer, Carlos Marun, do MDB, me confirmou a realiza\u00e7\u00e3o do encontro no local, a hora e os participantes descritos no contrato. \u201cO candidato Moro exp\u00f4s seu plano inicial de governo, suas ideias iniciais e se estabeleceu quase um bate-papo, j\u00e1 que era esse o objetivo. Um encontro pequeno onde as coisas pudessem ser conversadas com tranquilidade\u201d, me disse Marun.<\/p>\n O emedebista me confirmou que Moro se apresentava como pr\u00e9-candidato no encontro e tratava de propostas de um eventual governo.<\/p>\n Pedi \u00e0 especialista em contabilidade eleitoral Denise Goulart Schlickmann<\/a>, membro da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Pol\u00edtico, uma avalia\u00e7\u00e3o sobre a legalidade do encontro. Fiz um questionamento hipot\u00e9tico, citando as informa\u00e7\u00f5es desta reportagem, sem revelar o nome da empresa Ativa e de Sergio Moro.<\/p>\n Schlickmann<\/a> considerou que h\u00e1 uma zona cinzenta na legisla\u00e7\u00e3o sobre regras para pr\u00e9-candidatura e que apenas se esse caso espec\u00edfico fosse analisado juridicamente pelas autoridades eleitorais poderia se avaliar, por exemplo, uma doa\u00e7\u00e3o de dinheiro realizada por uma pessoa jur\u00eddica, o que \u00e9 proibido pela lei.<\/p>\n \u201cNesse per\u00edodo de pr\u00e9-campanha, como ele n\u00e3o est\u00e1 regulamentado, a \u00fanica coisa que podemos dizer com seguran\u00e7a na lei das elei\u00e7\u00f5es \u00e9 que o partido pol\u00edtico pode promover eventos. Mas o pr\u00e9-candidato n\u00e3o. Ele est\u00e1 sempre sujeito a uma avalia\u00e7\u00e3o da Justi\u00e7a Eleitoral que pode n\u00e3o ser favor\u00e1vel\u201d, comentou.<\/p>\n \u201cO melhor dos mundos seria ter isso [a regulamenta\u00e7\u00e3o] \u00e0s claras. O que, efetivamente, as pessoas podem ou n\u00e3o fazer. Usar uma pessoa jur\u00eddica, se for isso realmente o que aconteceu, pretensamente a seu favor, de sua propriedade ainda, com certeza n\u00e3o seria uma pr\u00e1tica considerada l\u00edcita\u201d, concluiu ela.<\/p>\n \nFoto: Patricia Monteiro\/Bloomberg via Getty Images<\/p><\/div>\n Por uma ironia da conjuntura, na ter\u00e7a-feira, Moro se sentou \u00e0 mesa com um cr\u00edtico do seu trabalho como juiz. Em 2019, enquanto trabalhava na defesa pol\u00edtica de Cunha, Carlos Marun acusou os procuradores da Lava Jato de medirem \u201cos outros por sua pequena ou inexistente r\u00e9gua moral\u201d<\/a>.<\/p>\n Mediador do evento na Ativa, Marun ficou conhecido como um dos principais membros da tropa de choque do ex-presidente da C\u00e2mara, Eduardo Cunha, do MDB, e ajudou a dificultar a cassa\u00e7\u00e3o do colega parlamentar o quanto p\u00f4de. Com a ascens\u00e3o de Michel Temer ao poder, o ent\u00e3o deputado foi al\u00e7ado a ministro da Secretaria de Governo.<\/p>\n O ex-deputado me contou que presta consultoria para a Ativa Investimentos, mas que apareceu neste encontro gratuitamente, como convidado.<\/p>\n \u201cO encontro foi promovido por uma empresa de investimento para seus clientes com o ministro Moro, e fui convidado para fazer coment\u00e1rios pol\u00edticos, e o economista \u00c9tore [Sanchez, economista-chefe da Ativa Investimentos] foi convidado para fazer coment\u00e1rios na \u00e1rea econ\u00f4mica\u201d, me disse Marun. Al\u00e9m de \u00c9tore Sanchez, Marun n\u00e3o quis dar os nomes de outros participantes, apenas comentou que Moro estava acompanhado de uma assessora e n\u00e3o havia outros pol\u00edticos no local.<\/p>\n \u201cReuni\u00e3o pequena para poucas pessoas, e eu n\u00e3o tenho conhecimento em rela\u00e7\u00e3o aos clientes da empresa. N\u00e3o sei [dizer] quem estava presente\u201d, desconversou Marun. Questionei a Marun se Dody Sirena estava na reuni\u00e3o. Ele disse que o empres\u00e1rio n\u00e3o estava e fez quest\u00e3o de me demonstrar que o conhece. \u201cEu sei porque eu conhe\u00e7o Dody, e ele n\u00e3o estava presente\u201d, falou.<\/p>\n Na ter\u00e7a-feira, dia da reuni\u00e3o, liguei para Sanchez, mas ele n\u00e3o atendeu. Por mensagem no seu WhatsApp, evitou comentar o assunto e pediu para que procurasse a assessoria de imprensa da Ativa Investimentos.<\/p>\n Um segundo evento com Moro e a Ativa Investimentos dever\u00e1 ocorrer em \u201cS\u00e3o Paulo\/SP, em data e hor\u00e1rio a serem ajustados em comum acordo entre as Partes\u201d, de acordo com o contrato.<\/p>\n Procurei o empres\u00e1rio Dody Sirena por meio de sua p\u00e1gina no Instagram e no telefone da DC Set, empresa controladora da Delos. Por e-mail, pedi informa\u00e7\u00f5es e esclarecimentos para o diretor da Delos que assina o contrato com Moro, Rodrigo Mathias. At\u00e9 o final da tarde de sexta-feira, nenhum deles se posicionou.<\/p>\n The post Moro negociou duas palestras a R$ 77 mil com Ativa Investimentos para discutir campanha<\/a> appeared first on The Intercept<\/a>.<\/p>\n\n This post was originally published on The Intercept<\/a>. <\/p>","protected":false},"excerpt":{"rendered":" Encontro sigiloso no Rio com plateia selecionada debateu propostas e viabilidade financeira da campanha. 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\nR\u00e9gua moral<\/h3>\n