{"id":801954,"date":"2022-09-17T16:04:56","date_gmt":"2022-09-17T16:04:56","guid":{"rendered":"https:\/\/theintercept.com\/?p=408154"},"modified":"2022-09-17T16:04:56","modified_gmt":"2022-09-17T16:04:56","slug":"ministerio-da-defesa-esconde-relatorios-de-redes-sociais-com-dados-pessoais-por-temer-narrativas-mal-intencionadas","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/radiofree.asia\/2022\/09\/17\/ministerio-da-defesa-esconde-relatorios-de-redes-sociais-com-dados-pessoais-por-temer-narrativas-mal-intencionadas\/","title":{"rendered":"Minist\u00e9rio da Defesa esconde relat\u00f3rios de redes sociais com dados pessoais por temer ‘narrativas mal-intencionadas’"},"content":{"rendered":"

Este texto foi publicado originalmente na newsletter do Intercept.\u00a0Assine<\/a>. \u00c9 de gra\u00e7a, todos os s\u00e1bados, na sua caixa de e-mails.<\/em><\/p>\n

O Minist\u00e9rio da Defesa<\/u> contratou em fevereiro de 2021 uma empresa para monitorar redes sociais. Seria um servi\u00e7o comum \u2013 e necess\u00e1rio \u2013 de an\u00e1lise de reputa\u00e7\u00e3o e m\u00eddia na internet. Mas o governo se recusa h\u00e1 meses a divulgar os relat\u00f3rios produzidos pela Supernova Servi\u00e7os de Informa\u00e7\u00e3o. E a justificativa n\u00e3o poderia ser mais esdr\u00faxula: a pasta alega que os conte\u00fados “podem ser instrumento de narrativas mal-intencionadas e vazias de boa-f\u00e9, induzindo julgamento impr\u00f3prio e prejudicial ao Minist\u00e9rio”. A resposta foi dada em negativa a um recurso de um pedido feito via Lei de Acesso \u00e0 Informa\u00e7\u00e3o.<\/p>\n

A Supernova Servi\u00e7os de Informa\u00e7\u00e3o LTDA foi escolhida, por meio de um edital, para monitorar 24 horas por dia, sete dias por semana, a imagem do \u00f3rg\u00e3o nas redes sociais. Segundo o contrato, a Supernova deveria indicar “repercussa?o (o que?), perfis influenciadores (quem), mi?dia (onde, quando), reputac?a?o e polarizac?a?o (como)”.<\/p>\n

O edital, lan\u00e7ado em dezembro de 2020, era exclusivo a pequenas empresas. O menor pre\u00e7o venceria. O Minist\u00e9rio da Defesa mencionou uma diretriz da Pol\u00edtica Nacional de Defesa, a PND, na justificativa para a contrata\u00e7\u00e3o: \u201csensibilizar e esclarecer a opinia?o pu?blica, com vista a criar e conservar uma mentalidade de Defesa Nacional, por meio do incentivo ao civismo e a? dedicac?a?o a? Pa?tria\u201d.<\/p>\n

Para o governo, o desempenho da \u00e1rea de comunica\u00e7\u00e3o institucional do minist\u00e9rio n\u00e3o estava satisfat\u00f3rio. O monitoramento de m\u00eddia era feito apenas em jornais matinais e revistas semanais \u2013 na internet, era inconstante. Para o minist\u00e9rio, monitorar redes sociais era “crucial”. “Atualmente, as demandas na a?rea de comunicac?a?o social te?m demonstrado para o Ministe?rio da Defesa e para as autoridades do alto escala?o que as noti?cias avanc?am em uma velocidade nunca antes vista”, diz o edital. “A correta informac?a?o disponibilizada nos mais diversos canais de comunicac?a?o disponi?veis, evitam a evoluc?a?o de crises que podem desencadear-se e ficarem incontrola?veis”.<\/p>\n

Por R$ 3,9 mil por m\u00eas, totalizando um contrato de R$ 47,7 mil, a Supernova foi escolhida. Segundo o contrato, o monitoramento tamb\u00e9m deveria ter tende?ncias, cen\u00e1rios e “demais informac?o?es estrate?gicas oportunas a? tomada de decisa?o, tal como engajamento negativo”. “Fatos intempestivos que tenham obtido destaque no ciberespac?o, e que de alguma forma estejam relacionados ao objeto monitorado” deveriam ser alertados ao Minist\u00e9rio da Defesa. A empresa forneceria o resultado “de forma clara e por interm\u00e9dio de gr\u00e1ficos informativos e textos explicativos”.<\/p>\n

Como entreg\u00e1veis, o Minist\u00e9rio da Defesa pediu dois relat\u00f3rios di\u00e1rios, com men\u00e7\u00f5es, assuntos mais comentados, perfis mais influentes, polariza\u00e7\u00e3o e mosaicos de palavras. Eles deveriam ser organizados por ordem cronol\u00f3gica e “perfil mais influente”. \u00c9 o governo que determinaria os temas a serem monitorados pela empresa.<\/p>\n

Tento desde abril deste ano ter acesso aos relat\u00f3rios por meio da Lei de Acesso \u00e0 Informa\u00e7\u00e3o. As respostas criativas do governo para sucessivas negativas levantam algumas quest\u00f5es sobre o teor desse monitoramento.<\/p>\n

A primeira recusa argumentava que eram muitos arquivos \u2013 o que demandava muito trabalho \u2013 e que os relat\u00f3rios eram “propriedade intelectual” da contratada e foram “cedidos” ao minist\u00e9rio mediante pagamento. Al\u00e9m disso, argumentou o governo, no \u00e2mbito da Defesa seria mantido, “independentemente de classifica\u00e7\u00e3o, acesso restrito em rela\u00e7\u00e3o \u00e0s informa\u00e7\u00f5es e documentos sob seu controle e posse armazenados em qualquer suporte”, relacionados \u00e0 “informa\u00e7\u00f5es pessoais relativas \u00e0 intimidade, \u00e0 vida privada, \u00e0 honra e \u00e0 imagem das pessoas” e dados pessoais.<\/p>\n

Recorri, \u00e9 claro. Embora os documentos tenham sido produzidos por uma empresa, eles foram comprados mediante o uso de verbas p\u00fablicas por um ente p\u00fablico. Ou seja: est\u00e3o sujeitos \u00e0 publicidade prevista na Lei de Acesso \u00e0 Informa\u00e7\u00e3o e a outras regras inerentes \u00e0 administra\u00e7\u00e3o p\u00fablica. A desculpa da propriedade intelectual tamb\u00e9m n\u00e3o cola: o pr\u00f3prio governo afirmou que as informa\u00e7\u00f5es foram “cedidas mediante pagamento”. Ou seja, qualquer direito de propriedade intelectual caiu quando as informa\u00e7\u00f5es foram cedidas ao governo, tornando-se p\u00fablicas.<\/p>\n

Questionei tudo isso no primeiro recurso, tamb\u00e9m negado. O Minist\u00e9rio da Defesa disse que havia mais de 1,5 mil relat\u00f3rios fornecidos at\u00e9 o momento, totalizando 19,5 mil p\u00e1ginas. E que os conte\u00fados n\u00e3o eram “informa\u00e7\u00f5es acabadas”. Foi a\u00ed que falou, pela primeira vez, que a “an\u00e1lise individualizada, desconexa ou fora de momento \u00e9 pass\u00edvel de equ\u00edvoco de entendimento ou de interpreta\u00e7\u00e3o” e que, at\u00e9 o momento, o material n\u00e3o tinha gerado nenhum ato e nem “mudan\u00e7a de dire\u00e7\u00e3o s\u00f3lida” nos processos da pasta. Disse tamb\u00e9m que a adequa\u00e7\u00e3o do material para divulga\u00e7\u00e3o demandaria “esfor\u00e7o adicional” e prejudicaria a Supernova, pois a exposi\u00e7\u00e3o de sua an\u00e1lise e metodologia poderia causar “desvantagem comercial”.<\/p>\n

Por fim, o Minist\u00e9rio da Defesa evocou o famigerado inciso 1 do artigo 31 da LAI, aquele do sigilo de 100 anos para informa\u00e7\u00f5es pessoais, para negar o acesso. “A divulga\u00e7\u00e3o segura de conte\u00fado, de forma a preservar informa\u00e7\u00f5es pessoais, requer trabalho adicional de adequa\u00e7\u00e3o, considerado n\u00e3o razo\u00e1vel”, disse o minist\u00e9rio. Ou seja: os relat\u00f3rios brutos, individualizados, poderiam expor informa\u00e7\u00f5es pessoais, portanto protegidas, e o governo achou muito trabalho adequar esse material para publiciza\u00e7\u00e3o.<\/p>\n

Hm. Se realmente se trata de um monitoramento de redes sociais \u2013 ou seja, com informa\u00e7\u00f5es colhidas em fontes abertas e p\u00fablicas, dispon\u00edveis na internet \u2013, n\u00e3o h\u00e1 necessidade de sigilo. Ou a empresa estava monitorando informa\u00e7\u00f5es pessoais sigilosas, relativas \u00e0 intimidade, \u00e0 vida privada, \u00e0 honra e \u00e0 imagem das pessoas? Foi assim que recorremos mais uma vez, em segunda inst\u00e2ncia. E, novamente, o governo argumentou a mesm\u00edssima coisa, negando o acesso.<\/p>\n

Resolvi fazer um novo pedido, estabelecendo um per\u00edodo espec\u00edfico dos relat\u00f3rios \u2013 assim, o n\u00famero de documentos seria muito menor e n\u00e3o demandaria o tal “trabalho adicional”. Mais uma vez, o pedido foi negado. Pelos mesmos motivos. Desta vez, n\u00e3o recorri \u2013 ainda. Mas resolvi contar a luta para conseguir uma documenta\u00e7\u00e3o que, em princ\u00edpio, deveria ser p\u00fablica.<\/p>\n

Qual \u00e9 o problema de divulgar os relat\u00f3rios? O que h\u00e1 neles? Estaria o Minist\u00e9rio da Defesa classificando influenciadores e pessoas comuns na internet como “detratores”, como fez o relat\u00f3rio do Minist\u00e9rio da Economia divulgado em 2020? Por que a divulga\u00e7\u00e3o desses documentos poderia levar a “narrativas mal-intencionadas”? Cabe a um \u00f3rg\u00e3o p\u00fablico julgar o tipo de “narrativa” que ser\u00e1 dada a um documento p\u00fablico?<\/p>\n

Para essa \u00faltima, eu sei a resposta: n\u00e3o. Nenhuma solicita\u00e7\u00e3o de informa\u00e7\u00e3o precisa ser justificada ou motivada. Mas, para um \u00f3rg\u00e3o que parece empenhado em controlar a narrativa sobre si mesmo, faz sentido esconder informa\u00e7\u00f5es para evitar que algo potencialmente comprometedor venha \u00e0 tona.<\/p>\n

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Relat\u00f3rios de monitoramento s\u00e3o produzidos desde fevereiro de 2021. Segundo o governo, sua divulga\u00e7\u00e3o poderia induzir ‘julgamento impr\u00f3prio’.<\/p>\n

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